Música que Ouço
Um blog onde fazemos comentários sobre músicas/discos que ouvimos. Sempre que possível também mostramos onde comprá-los, ou onde ouví-los na Internet.
quarta-feira, 28 de julho de 2010
Ligiana: De Amor e Mar
Fazia tempo que não escrevia, como é complicado manter um blog! Passo mais ainda a admirar blogs como o Um Que Tenha que se mantém ativo por muitos anos. E foi por intermédio do Um Que Tenha que fiquei sabendo dessa pérola, e é uma pérola porque seria quase que impossível eu achar esse disco de outra forma. Moro no exterior e meu acesso a música brasileira ficou muito restrito. Estou agora no Brasil (visitando) e achei uma cópia pra mim. Que felicidade! O Mais complicado desse disco é descrevê-lo em palavras. Vejo um renascimento de cantoras no Brasil que nos faz ficar perdido, mas Ligiana é diferente. Com uma voz afinadíssima, ela se lança no mercado com um disco que tem um repertório magnífico e diverso. Mas acho que minhas favoritas são o sambão "Consideração" e a linda "Só se Não For Brasileiro Nessa Hora". Mas não acreditem em mim. Visitem a página da artista (ligiana.com) e ouçam um pouco. Depois vocês me falem.
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
Zeca Baleiro & Hilda Hilst: Ode Descontínua e Remota Para Flauta e Oboé - de Ariana para Dionísio
Já faz algum tempo que não vinha aqui falar de uma gravação, muito trabalho, mudança de prédio no trabalho e provável mudança de residência são apenas alguns motivos para a falta de tempo. Mas esse disco merece o comentário porque é extraordinário. Zeca Baleiro, músico maranhense, mostra todo o seu talento musicando o poema supra-citado (título) de Hilda Hilst. As dez partes do poema são cantadas por grandes vozes femininas da nossa música. Angela Ro Ro, Maria Bethania, Mônica Salmaso, Olivia Byington, Rita Ribeiro, Angela Maria, Jussara Silveira, Ná Ozzetti, Verônica Sabino e Zélia Duncan fazem deste disco uma obra prima. O poema é maravilhoso e as músicas do Zeca "apenas" enfatizam a beleza desta obra de Hilda Hilst. Minha interpretação favorita (foi complicado escolher) é a Canção IV com Jussara Silveira. Se não têm o disco ainda, comprem. O dinheiro será muito bem empregado. Se quizerem ouvir o disco podem procura no novo Um Que Tenha.
quarta-feira, 17 de junho de 2009
Joshua Redman: Compass
UM SINGULAR DISCO NO PLURAL
Tenho que admitir. Não estou escutando música como realmente gosto. Depois das 11, quase meia noite, quando o silêncio se inicia, até a madrugada, sozinho, com pouca luz. Imperdoável! Ouvir música é um ato de recolhimento, um reencontro com a parte da vida que é superior a isso que chamamos de real, uma aproximação de nossos deuses, se é que eles existem e estão em algum lugar. Não importa. Basta deixarmos que a música nos leve para alguns andares acima dos desejos humanos, carnais e efêmeros. Ouvindo música, ritualisticamente, acredito que
alguma coisa existe além do nosso entorno palpável. Mas tenho o defeito de querer ouvir música na solidão. Entre amigos, ao lado da pessoa amada, dentro do carro, caminhando, batendo papo, também é bom, mas a música torna-se acessória. O ideal mesmo é ouvir música ao vivo, num teatro, no ato de sua feitura, sem precisar estocar. Como nem sempre isso é possível, parto para música em conserva. Para compensar, imagino que sou a platéia, única e soberana. Meu equipamento é um palco imaginário. Tem vantagens. Sinto-me parte da música, ouço o que quero e como quero, com mais ninguém no meu teatro. Transgrido sem medo.
Já passaram algumas semanas depois que Ronaldo convidou-me para escrever em seu (agora nosso) blog. Tenho procurado tempo, para a escrita e a volta verdadeira ao meu ritual semanal de audição musical. Mantenho meu programa na Rádio Universitária de Fortaleza, nem sei como. Apenas faço, toda segunda-feira. Mostro um concerto de jazz gravado ao vivo, em algum lugar do planeta. Agora, com esse texto e o disco sobre o qual vou escrever, retorno ao meu antigo day-off, uma passagem por fora do mundo cotidiano, onde dispo-me dos problemas que não tenho, escondo-me de quem não me procura, saio do ar estando em terra. Um momento único que me permite o luxo de não fazer nada, não pensar em nada, apenas ouvir música, isolado nesse meu teatro particular e imaginário, nos alpes da cidade de Fortaleza. Uma pura cachaça é bem-vinda nesse meu lugar.
Já passaram algumas semanas depois que Ronaldo convidou-me para escrever em seu (agora nosso) blog. Tenho procurado tempo, para a escrita e a volta verdadeira ao meu ritual semanal de audição musical. Mantenho meu programa na Rádio Universitária de Fortaleza, nem sei como. Apenas faço, toda segunda-feira. Mostro um concerto de jazz gravado ao vivo, em algum lugar do planeta. Agora, com esse texto e o disco sobre o qual vou escrever, retorno ao meu antigo day-off, uma passagem por fora do mundo cotidiano, onde dispo-me dos problemas que não tenho, escondo-me de quem não me procura, saio do ar estando em terra. Um momento único que me permite o luxo de não fazer nada, não pensar em nada, apenas ouvir música, isolado nesse meu teatro particular e imaginário, nos alpes da cidade de Fortaleza. Uma pura cachaça é bem-vinda nesse meu lugar.
Foi lá que ouvi o irretocável disco do saxofonista Joshua Redman, um americano de 40 anos, que sempre admirei, apesar de alguns passos equivocados de sua discografia. Redman é um daqueles músicos que emergiram no jazz nos anos 90 e logo foram intitulados com o horroroso apelido de young lions. Que mania besta essa das imprensas especializadas. Rotulam tudo e todos, principalmente quanto militam no mundo das artes. Arte não carece de nome e sim de emoção.
Na década de 90, ouvia muito um disco de Joshua Redman, gravado no início de sua carreira, com a participação do guitarrista pop star Pat Metheny. Era o álbum “Wish” (1993), seu segundo trabalho. Lembro-me que ouvia esse disco com minha cúmplice, hoje minha namorada e mãe de meu filho, que nem gosta muito de jazz. Lá, no século passado, ainda gravando canções mais populares e tentando catapultar sua carreira, Redman saiu-se muito bem nos temas simples, incluindo Eric Clapton e Steve Wonder. Era um sax melódico e tonal, quase um smooth jazz, sem ser enfadonho ou meloso. Outro disco de Redman que muito me marcou foi “Spirit of the Moment: Live at the Village Vanguard” (1995), um álbum duplo gravado ao vivo. Ali, Redman me conquistou definitivamente. Gosto de jazz feito ao vivo, mesmo enlatado, principalmente quando sobram os ruídos do ambiente, as impurezas de gravação, as vozes ao fundo. Detalhes sujos que tornam o jazz uma música cheia de purezas, muito mais jazz.
Depois de 14 anos, ouço outro Redman, em seu 14º álbum, “Compass” (2009), um trabalho autoral, ousado, maduro, onde se mostra como um instrumentista e compositor de jazz, autêntico e sem títulos midiáticos. Como dizemos no Ceará, um disco de “amostrado”. A alma do disco pode não ser de Sonny Rollins, mas com certeza ele andou passando pelo Avatar Studio, na cidade de Nova Iorque. Ouça “Round Reubem”, feche os olhos e ache o sax de Rollins. É uma bolacha singular e plural. Singular no vanguardismo melódico de seus temas. Plural, literalmente, na ousadia de Redman, com seu sax tenor que vale por dois, acompanhando-se de duas baterias e dois contrabaixos. Isso mesmo, um quinteto, quase sexteto, formado por três instrumentos. O álbum foi construído com 13 temas, 9 deles de Redman. Um desses temas “Noredman” é criação coletiva, dois outros de seus músicos parceiros e uma belíssima homenagem ao alemão Ludwig Van Beethoven, a sonata “Moonlight”, que não abre o disco, mas conquista definitivamente o ouvinte. Uma prece. Na sonata beethoviana, os baixos de Larry Grenadier e Reubem Rogers anunciam a oração, como se implorassem por silêncio profundo, quase fúnebre, textura da amada imortal. Os pratos de Brain Blade e a caixa de Gregory Hutchinson preparam o altar, dão volume, anunciam a celebração. As notas do sax tenor de Redman invadem o ambiente. E nessa hora é inevitável. Tem que parar tudo e ouvir, simples assim. São sons-palavras, pronunciadas na língua universal, nos convidando nossa mais secreta oração. Só essa faixa já valeria o disco. Melhor, tem outras 12.
O tema que apresenta o álbum é “Uncharted”, uma criação coletiva, interpretada pelos próprios compositores. Os primeiros acordes do álbum são, naturalmente, de Redman. As notas de seu tenor anunciam o disco. Ali, já nos primeiros segundos, percebemos que estamos ouvindo algo novo, ou pelo menos diferente. Uma conversa de quatro instrumentistas (Brian Blade não abre o disco). O saxofone define o rumo da viagem que vamos fazer. Música, acima de tudo, com muito espaço para criação individual, luxuosas improvisações, respeito pelo músico do lado, pelo ouvinte. É assim durante todo o disco. Perfeito.
Como o meu equipamento de som não é um compacto made in china, consegui ouvir cada detalhe. E é no detalhe que o disco é grande. Cada faixa vem com a indicação de como os instrumentos estão separados por canal, o que facilita muito a identificação das cores de cada um desses geniais artesãos da música. Como são dois contrabaixos e duas baterias, para o ouvinte menos atento, essa informação é imprescindível, pois permite sentir as nuanças e diferenças entre os dois baixistas e dois bateristas.
Ficaria horas descrevendo os outros temas do álbum, quase todos de Redman. Melhor mesmo é terminar o texto e ouvir mais uma vez. Na minha modesta opinião, o melhor lançamento de 2009, até agora. Volto para o meu day-off. Quem sabe, lá descubro outra pérola negra para comentar aqui.
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